Existe uma crença popular de que as montadoras evitam a todo custo fazer os famigerados recalls. Pode até ser doloroso, caro, angustiante. Mas as grandes fabricantes já descobriram que eles podem ser uma ferramenta positiva de marketing, se bem utilizados.
Não me entenda mal. Mas é que já trabalhei numa das grandes montadoras brasileiras e o primeiro recall a gente nunca esquece. Num certo dia, o diretor geral me chamou e disse: Precisamos entrar no ar com uma chamada de recall amanhã, no máximo! Quem trabalha com propaganda, facilmente irá entender meu desespero. Você não consegue, em 24 horas, estar com um comercial nas emissoras brasileiras. A não ser que...
Pois é. Naquele dia aprendi a importância de um recall. Tiramos uma campanha do ar e a substituímos por uma chamada para que os clientes comparecessem à concessionária mais próxima. E a frase final do comercial, que citava o respeito ao consumidor, dizia e diz muito para mim até hoje.
Não podemos nos esquecer que é quase impossível não ter problemas numa linha de produção. Não somente de automóveis, mas de qualquer tipo de produto que enfrente essa forma de fabricação. No caso da indústria automotiva, são vários os fatores que contribuem para isso, desde a complexidade do produto, formado por milhares de peças, até o processo em si, que gera diversas chances para que a lei de Murphy (Se alguma coisa pode dar errado, dará) se materialize.
Na maior parte das vezes, os recalls são gerados não por reclamações do consumidor, mas pelos próprios testes de qualidade que continuam a ser feitos nos carros que saem das fábricas. Há pouco tempo, uma das grandes montadoras fez um recall devido a um problema de má fixação do cinto de segurança. Ele surgiu porque o molde do fornecedor teve um desgaste, gerando o inconveniente. Interessante notar que a grande maioria dos carros com o problema não tinha nem três meses de mercado. Mas os testes de campo já indicavam a fadiga da peça. E o consumidor pode ser chamado antes mesmo dela se manifestar.
Qualquer montadora que preze sua imagem conhece os riscos inerentes de não assumir esse tipo de situação e tentar evitar um recall. É como um bumerangue. Você o joga para longe, pensando que se livrou, e ele volta com muito mais força, destruindo tudo que encontra pelo caminho: vendas, reputação e rentabilidade. É mais fácil tratá-la como uma bola de neve, resolvendo no nascedouro e evitando que ela cresça.
Um bom executivo da indústria considera o recall uma ferramenta de marketing tão importante quanto um novo modelo a ser lançado. E sabe que o consumidor também confia mais naquela montadora que não tem medo de corrigir, por si própria, seus próprios erros.
Aquelas que tentam esconder possíveis problemas, com essas não precisamos nos preocupar. O próprio mercado se incumbe de ensiná-las, tirando, pouco a pouco, as vendas de suas mãos. E fazendo com que o medo que elas tem do recall se concretize, eliminando-as do mercado.
Nenhum comentário:
Postar um comentário